Mais a visão se aprofunda,
mais estrelas se percebem,
na escuridão...

17 de fevereiro de 2019

Anjos da noite


À noite, nos libertamos
e agimos sós, um só, vivos.
Dominamos cada momento e, extasiados,
podemos estender os braços e colher estrelas,
ou um punhado de areia, vivo.

Somos donos de um pedaço do universo,
dele todo, ou de nada.
Força pulsante, chama e oceano, nós.

Percorremos as assembléias dos homens
e derramamos a paz nos ambientes.
Corrigimos enganos da existência
e consertamos seres maltratados, adormecidos.

Sabemos o amor
e os breves toques de lábios nas faces, à noite.

Arrancamos das frestas escuras a felicidade,
para forjá-la e realizá-la a sós,
com desespero de poetas.

Geramos idéias e soluções,
imploramos ao trigo que cresça,
construímos ferramentas que as mãos do homem
haverão de marcar pelo uso.

Somente durante a noite,
rasgamos a solidão do convívio geral
e bastamos um ao outro,
preparando a mística da vida iminente.

E, quando o dia ameaça despertar o mundo inerte,
conseguimos ainda correr ao lado das ondas
e devolver as últimas estrelas, do peito para o céu,
antes de retornarmos aos dois corpos
que descansam abraçados.

(para Jussára)

década de 80