Mais a visão se aprofunda,
mais estrelas se percebem,
na escuridão...

5 de outubro de 2012

Em nada creio


Pela palavra do Impronunciável, ungida,
cheguei à mesa do grande banquete.
Sentada à sua esquerda,
cotejei asseclas, insuflei hostes,
aliciei, traí, comprei, vendi, entreguei,
ameacei, cumpri, iludi, ganhei.

Venci!

Em nada creio, não preciso crer.
Sou a erva e o fruto do Mal Encarnado.
Tudo posso, pelo amor ao poder.

Meus mortos e mutilados mil vezes matei,
espectros do passado, exorcizados,
perseguidores do pensamento,
reduzidos a nada.
Tão poucos ante os tantos
que haverei de fazer,
pelo plano da moral infernal,
pela inversão dos valores,
pela crucificação dos santos,
pelas perdas insuspeitadas,
pela terra devastada,
pelo vilipêndio total,
pela dor do desalento.
 Ah! Como farei!

Em nada creio, não preciso crer.
Sou a erva e o fruto do Mal Encarnado.
Tudo posso pelo amor ao poder.

Sou névoa de estórias zelosas,
máscara, sorriso, vestes e aura,
palavras poucas de mesura e promessa,
dona da fé deste povo-instrumento,
apalermado,
ante os parvos idólatras da verdade,
humilhados.

 Em nada creio, não preciso crer.
Sou a erva e o fruto do Mal Encarnado.
Tudo posso, pelo amor ao poder.

Aos fracos de coração e pulso,
aos que subestimaram o risco,
aos que ousaram me perdoar,
aos que não pude matar,
meu ódio essencial, banhado em mel,
minha dissimulada vingança de fel,
meus cerrados dentes, sorridentes,
meu olhar de aridez invasora de almas,
minha ímpia maldade travestida.

Não importa o que disse, o que terei de dizer. 
Não importa o que fiz, o que terei de fazer.
  
Em nada creio, não preciso crer.
Sou a erva e o fruto do Mal Encarnado.
Tudo posso, pelo amor ao poder.

(Por motivos óbvios, omitido o nome da personagem...)

Setembro/2009