Mais a visão se aprofunda,
mais estrelas se percebem,
na escuridão...

30 de janeiro de 2012

Sombras




Acreditai, arrogantes, 
nas verdades transmutadas,
no discernimento anestesiado,
na palavra sufocada,
na vontade abatida.
na esperança enterrada.

Locupletai-vos
das vidas tributadas, saqueadas,
da riqueza da terra, vilipendiada,
da ignorância inocente, enganada,
subjugada pela esmola,
encabrestada.

Continuai a vossa festa depravada,
enquanto silenciosamente emergimos
dos percalços da luta honesta, diária,
das ruas e vielas, emaranhadas,
das esquinas da vida, circulares,
das filas do sistema de saúde, infindas,
dos hospitais públicos, sumidouros,
das escolas dos nossos filhos, doutrinárias,
das casas e terras abandonadas, invadidas,
dos confrontos entre irmãos, instigados,
da violência urbana, drogada, 
das instituições mais sagradas, loteadas,
da lembrança da cidadania,
entorpecida.

Somos agora imenso conclave de sombras
espreitando vossas vidas,
entidades conscientes, insuspeitadas,
caminhando já sorrateiras,
arrastando sonhos e pesadelos, desenhando rastros,
na implacável perseguição aos que nos tornaram
sombras das nossas vidas.

Transitaremos diuturnamente,
nas profundezas das vossas consciências brutalizadas,
nos halls, corredores e gabinetes suntuosos,
nos teatros, aeroportos, aviões e restaurantes,
nos salões dos vossos alfaiates e costureiros,
na grama, areia e piscina do vosso resort preferido,
nos tetos, paredes e pisos das vossas casas e muquifos.

Invadiremos os porões das vossas vidas,
adensaremos o ar fétido que respirais,
surgiremos nos melhores e piores momentos,
por entre as cédulas dos pagamentos espúrios,
por entre as pernas dos putos e putas que vos servem,
embaixo das vossas camas, por baixo das vossas cobertas,
por dentro das vossas roupas empertigadas,
queimando a pele fria e suada,
 até que nada mais vos conforte,
até que só vos acolha a escuridão,
até que imploreis pela luz
que eternamente vos haveremos de negar,
para que jamais torneis a contaminar
a verdade, o discernimento,
a palavra, a vontade e a esperança
desta nação.


(Dedicado àqueles que governam o Brasil, 
neste Dia da Independência,
um dos piores de que tenho memória.)



07.09.2010
©Alfredo Cyrino / Indigo Virgo®